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segunda-feira, 6 de setembro de 2010

BORRÕES SEM BORDA


A ventania entortou o céu. Passou e tirou tudo do lugar. Arrancou as raízes do chão, mesmo as mais longas e firmes. Olho em volta e não há natureza. Não há natural. É uma forma de estranhamento e a cada olhar é um deslocamento que me causa. Eu mesma estou toda troncha, contorcida, revirada. Eu não sei catar os cacos. Alguém perguntou pra eles se eles querem ser colados de volta onde um dia foram vaso? Onde um dia foram vidro de uma coisa só? Uma coisa só? Quem... O que... É uma coisa só? Tantos ventos, ventanias que passam por nós e através de nós nos fazendo dois, três, quatro, vários e tantos que já nem sabemos. E essas cacos que ficam no caminho e se perdem na estrada. E o óculos rachado que faz ver as coisas partidas ao meio. E quando se perde o óculos e a vida vira borrão. Minha vida tá um borrão de quem não tem óculos. E na teimosia de continuar a não ter fico vendo as coisas assim sem precisão e certeza. Ás vezes me forçam e descrevem a paisagem para mim, mas eu continuo a preferir fazer de todas as paisagens autorias minhas e decifrá-las como as vejo. Mesmo que sejam apenas borrões. E na fuga de formas endurecidas me cristalizei em borrões. Borrões sem borda.

Um comentário:

Naia Mello disse...

Os borrões dos cacos que perfuram tudo. é passageiro. Graças a deus.